Passados sete anos da assinatura do acordo de leniência, firmado pela J&F com o Ministério Público Federal (MPF), para o pagamento de multa e ressarcimento à Funcef e outras instituições, centenas de milhares de beneficários em todo o Brasil se veem perdidos com os rumos com que o caso tomou.

No acordo, empresas do grupo J&F se comprometeram a pagar o valor de R$ 10,3 bilhões por aportes feitos pela Funcef e outras instituições ao FIP Florestal – Fundo acionista da Eldorado Celulose. O valor pactuado deveria ser distribuído entre Funcef, Petros, Caixa, FGTS, BNDES e a projetos sociais, em um prazo de 25 anos.

No entanto, a partir da assinatura do acordo, o grupo J&F passou a fazer diversas tentativas para reduzir o valor devido, sendo última aceita pelo subprocurador da PGR, Ronaldo Albo, em junho de 2023, reduzindo o valor a ser pago de R$ 10,3 bilhões para R$ 3,5 bilhões, além de retirar a Funcef do rol de organizações beneficiadas.

Após diversas reviravoltas no caso, com a anulação do desconto por parte do Conselho Nacional do Ministério Público, em setembro/23; decisão monocrática para manter o desconto, pelo Corregedor Nacional do MPF, Oswaldo D’Albuquerque, em outubro/23; e com a desistência da manutenção do acordo pelo mesmo corregedor, também em outubro/23; o pagamento total da multa (10,3 bi) foi suspenso monocraticamente pelo ministro do STF, Dias Toffoli, em 20 de dezembro/23.

Na decisão, além da suspensão dos pagamentos de responsabilidade da empresa Novonor (ex-Odebrecht), por 60 dias úteis, a contar de 8 de fevereiro de 2024, Dias Toffoli concedeu à empresa acesso integral ao material colhido na Operação Spoofing e permitiu que reavalie os termos de acordo de leniência para “correção das ilicitudes e dos abusos identificados”, como consta em sua decisão (MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001).

Para Vânia Lacerda, presidente da Associação Paulista dos Economiários Aposentados (APEA/SP), a suspensão do acordo configura-se grande instabilidade jurídica que pode impactar negativamente a vida de centenas de milhares de beneficiários, sobretudo dos aposentados da Caixa.

“Nossa categoria de economiários aposentados já amarga pagamentos pesados de equacionamentos por déficits em nosso fundo de pensão. Se o acordo de leniência da J&F for revogado ou reduzido, esse prejuízo poderá ser ainda mais trágico para a nossa categoria. É lastimável que uma questão séria como essa seja tão suscetível ao poder econômico do grupo J&F”, lamenta a dirigente.

Para melhor entendimento sobre as idas e vindas, concessões e anulações, decisões e revogações, preparamos este infográfico.

Contra-ataque dos fundos de pensão

Em reação à decisão monocrática do ministro Dias Toffoli, os fundos de pensão da Caixa (Funcef) e da Petrobrás (Petros) entrarm no campo jurídico para defender o recebimento dos valores acordados.

No recurso da Funcef, a entidade afirma que o valor já está contabilizado em seu balanço e o não recebimento do recurso pode obrigá-la a “rever os seus cálculos de equacionamento e quiçá ser compelida a implementar novo plano de equacionamento de déficits, impactando na subsistência de todos os seus participantes (aposentados e pensionistas) e causando prejuízo a sua patrocinadora (CEF)”.

Por outro lado, em nota a Petros afirmou que a medida visa proteger o patrimônio dos participantes do fundo. “Na condição de beneficiária do acordo de leniência, que foi consolidado pela sentença que homologou o acordo, a Fundação tem legitimidade para defender o recebimento dessa obrigação de pagamento. Neste sentido, a nossa equipe jurídica responsável pelo processo tem atuado para definir a melhor estratégia e garantir os direitos da Fundação e de seus participantes”, afirmou.

O que é um acordo de leniência

O acordo de leniência é uma ferramenta contra a corrupção definida pela Lei Anticorrupção (12.846/2013). Ele permite que empresas que admitam participação em atividades ilegais contra o governo recebam punições mais leves.

Ao fazer o acordo, a empresa assume responsabilidade pelos seus atos e coopera com a justiça, fornecendo informações e provas. Isso é negociado com a Controladoria Geral da União.

Empresas que cometeram atos lesivos contra o governo federal ou estrangeiro podem propor o acordo. Além disso, o acordo pode acontecer em casos de fusão ou incorporação empresarial, desde que as pessoas envolvidas concordem. Os benefícios incluem redução de multas, isenção de proibições de contratar com o governo, entre outros.

Para assinar o acordo, a empresa precisa ser a primeira a propor, cessar as práticas ilegais, admitir a participação e cooperar com as investigações. A CGU também pode exigir melhorias no programa de integridade da empresa e o pagamento das multas estabelecidas.